Lido em: Agosto/2015
Autor: Caitlín R. Kiernan
Editora: DarkSide
Categoria:Ficção/Suspense Psicológico/Romance
Páginas: 320
Avaliação


Sinopse
Com uma narração intrigante, não-linear e uma prosa magnífica, Caitlín vai moldando a sua obsessiva personagem. Imp é uma narradora não-confiável e que testa o leitor durante toda a viagem, interrompe a si mesma, insere contos que escreveu, pedaços de poesia, descrições de quadros e referências a artistas reais e imaginários durante a narrativa. Ao fazer isso, a autora consegue criar algo inteiramente novo dentro do mundo do horror, da fantasia e do thriller psicológico.

Resenha

Um livro dentro de outro livro: é exatamente do que se trata. Fiquei tão imersa nesse livro que por momentos cheguei a duvidar da minha própria sanidade, tamanha fora a conexão que senti com a confusão interna da personagem principal. Esse foi um livro pesado e difícil. Difícil de terminar, difícil de digerir, impossível de esquecer… Ainda não sei bem o que falar dele, talvez ele não tenha sido escrito para que falássemos como se fosse um livro comum. O que sei é que nunca li nada parecido. A autora nos transporta para uma viagem pela mente confusa e louca de sua protagonista e narradora, e nos faz duvidar o tempo todo do que é real ou fantasia.

A Menina Submersa: Memórias é o nono livro da autora e com certeza uma história que levarei comigo para o resto da minha vida. Foi indicado em seis premiações e levou duas, dentre elas uma das mais relevantes para o gênero da fantasia, o Bram Stoker de 2013. É uma obra poderosíssima, que te prende do começo ao fim se você levá-lo a sério, ele te puxa para dentro e te cobre como um manto. Há muitos sentimentos paralelos sobre ele, e você consegue sentir na boca o gosto da loucura que ele transmite. Mas devo alertar: não se trata de um livro comum, é uma história de fantasmas, sereias e lobos. E uma garota louca.

Durante a leitura encontramos os relatos, as impressões e os sentimentos da mente conflituosa de India Morgan Phelps, ou Imp, como ela prefere que seja chamada. Mergulhamos de cabeça dentro da mente confusa dela, com suas loucuras, inseguranças e surtos. Não podemos confiar nela e em seus relatos, pois a própria Imp não confia em si e na sua memória. Temos as verdades (factuais, como diria Imp), temos dúvidas, acontecimentos imaginários, sonhos, números… Muitas coisas que nem a nossa protagonista entende. Tudo é um mar de confissões conflituosas por causa de sua doença mental. Por ter sido diagnosticada com esquizofrenia paranoide, Imp se confunde muitas vezes, chegando ao ponto de surtar por não conseguir ordenar os acontecimentos de maneira correta. Então, numa forma de superar esse tormento e sua própria loucura, Imp decide escrever um livro sobre sua vida e suas memórias.

Esse livro é totalmente escrito de forma não-linear, ora em primeira, ora em terceira pessoa, com trechos em que somos meros observadores, passíveis diante de fatos tão estranhos. O que por sua vez deixa a leitura marcada pelo interesse contínuo em entender sobre a mente tão perturbada de Imp. Para relatar a sua história de fantasmas com sereias e lobos, Imp acaba várias vezes discutindo com si mesma sobre a veracidade de suas supostas memorias, interrompendo a narrativa, riscando trechos e voltando a memórias anteriores, misturando novamente todos os acontecimentos.

A Menina Submersa: Memórias brinca muito com a interpretação do leitor com aquilo que oferece, buscando sempre apresentar a incerteza de Imp de uma forma tão implícita que chega a se tornar nossa. Vamos acompanhando o sofrimento de Imp por causa dos medicamentos para o tratamento sua esquizofrenia e como ela lida com a maldição que paira sobre as mulheres de sua família, pois a mesma doença levou sua avó e sua mãe ao suicídio.

Imp também tem transtornos e obsessões compulsivas, e algumas delas são direcionadas para músicas, números e principalmente para obras de arte. Ela começa a namorar Abalyn, uma transexual que vai morar em sua casa depois de um encontro repentino. Tudo isso complementa um quebra-cabeça em torno da história que Imp conta, mas existe algo, ou melhor, alguém que transforma a vida da nossa narradora. As coisas iam relativamente bem até Imp conhecer Eva Canning. E é aí justamente que seus problemas começam de verdade.

"Nenhuma história tem começo e nenhuma história tem fim. Começos e fins podem ser entendidos como algo que serve a um propósito, a uma intenção momentânea e provisória, mas são, em sua natureza fundamental, arbitrários e existem apenas como uma ideia conveniente na mente humana. As vidas são confusas e, quando começamos a relacioná-las, ou relacionar partes delas, não podemos mais discernir os momentos precisos e objetivos de quando certo evento começou. Todos os começos são arbitrários."

A autora escreve muito bem, tão bem que é como se ela fosse mesmo Imp, esquizofrênica, louca, confusa. Vou confessar: esse livro me assombrou, assombra e irá assombrar, me tirou totalmente da minha zona de conforto. Eu precisava ler devagar para absorver todo o conteúdo, mas tive de fazer algumas pausas para conseguir digerir algumas situações. Foi uma grande peça da minha vida, é delicado e brusco, com muitos trechos e frases maravilhosas, que me faziam parar a todo tempo para admirá-las e marcá-las. É um conto de fadas para pessoas que já cresceram que consegue ver o mundo com outras perspectivas. Portanto, se você curte algo nesse gênero e deseja o desafio de conhecer uma esquizofrênica e sua mente louca, se jogue em A Menina Submersa e deixe o canto da sereia te hipnotizar.